A troca de informações pessoais por descontos em medicamentos levanta questões sobre o uso de dados sensíveis e a necessidade de regulamentação
Fornecer o número do CPF em farmácias se tornou um hábito, mas as pessoas sabem pouco, ou nada, sobre o destino de seus dados. |
O hábito de fornecer o CPF em troca de descontos em farmácias, uma prática comum no Brasil, tem se tornado o centro de um debate complexo sobre privacidade, proteção de dados e ética empresarial. Uma reportagem recente revelou que as grandes redes de farmácias estão utilizando esses dados para impulsionar um modelo de negócios bilionário baseado em publicidade direcionada. A coleta e o uso dessas informações, que incluem o histórico de saúde dos consumidores, levantam questões importantes sobre os limites da exploração comercial de dados pessoais, especialmente quando se trata de informações sensíveis como aquelas relacionadas à saúde.
A reportagem destaca que a Raia/Drogasil, a maior rede de farmácias do país, possui um banco de dados com informações de 48 milhões de clientes. Esses dados são utilizados para segmentar anúncios com alto grau de precisão, tanto no site da farmácia quanto em redes sociais. A empresa RD Ads, pertencente ao grupo Raia/Drogasil, é responsável por essa operação, que movimenta cifras bilionárias. O CEO da RD Ads afirmou que a prática de solicitar o CPF é tão comum no Brasil que 97% dos clientes o fornecem sem hesitar, o que contrasta com a realidade de outros países, onde essa solicitação seria considerada invasiva e até mesmo ilegal.
A reportagem também levanta dúvidas sobre a veracidade dos descontos oferecidos em troca do CPF. Em alguns casos, os preços sem o documento parecem ser inflados artificialmente para incentivar o fornecimento dos dados pessoais. Além disso, a prática de usar informações de saúde para direcionar anúncios é questionável do ponto de vista ético e legal. A Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) classifica informações de saúde como dados sensíveis, exigindo maior proteção e podendo restringir seu uso para fins comerciais.
A questão da coleta de dados biométricos em farmácias também é abordada na reportagem. Em 2021, houve protestos públicos contra a exigência de fornecer a digital para obter descontos em medicamentos. A prática foi suspensa após intervenção do Procon e do Instituto de Defesa do Consumidor (Idec), mas o pedido do CPF persiste.
O debate sobre o uso de dados pessoais por farmácias evidencia a necessidade de uma regulamentação mais clara e rigorosa sobre o tema. A LGPD, embora represente um avanço na proteção de dados, ainda deixa margem para interpretações e lacunas que precisam ser preenchidas. A sociedade precisa discutir os limites da exploração comercial de dados pessoais, especialmente quando se trata de informações sensíveis como aquelas relacionadas à saúde. Afinal, o direito à privacidade é um direito fundamental que deve ser protegido e respeitado.
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