Medida polêmica proposta pelo governo estadual abre brechas para conflitos de competência e críticas ácidas entre as forças policiais de São Paulo
Polícia Militar ganha poderes de investigação: debate acirrado sobre os limites da atuação policial. |
No epicentro de uma controvérsia jurídica e policial, o governo Tarcísio de Freitas (Republicanos) sinaliza uma guinada radical no cenário da segurança pública em São Paulo. Sob a justificativa de aliviar a sobrecarga das delegacias, a gestão atual promove uma manobra sem precedentes: a transferência de poderes investigativos à Polícia Militar (PM), desencadeando reações inflamadas e questionamentos éticos sobre a separação de funções entre as instituições policiais do estado.
A iniciativa em questão se materializa na forma do chamado Termo Circunstanciado Policial Militar (TC/PM), um dispositivo concebido para registros e diligências relacionados a delitos de menor potencial ofensivo. Num movimento audacioso, o governo estadual confere aos agentes da PM a prerrogativa de conduzir investigações anteriormente atribuídas exclusivamente à Polícia Civil, desafiando as fronteiras tradicionais entre as duas esferas de atuação policial.
Assinado pelo atual subcomandante da PM, coronel José Augusto Coutinho, o documento delineia um plano de ação meticuloso, que inclui não apenas a implementação do TC/PM, mas também a reestruturação de batalhões e um programa acelerado de capacitação para os membros da corporação, visando sua adaptação às nuances da legislação criminal.
Os primeiros passos rumo à concretização desse projeto já foram dados neste mês, alimentando especulações sobre sua eficácia e suas consequências a longo prazo. Na prática, o TC/PM facultará aos policiais militares a realização de diligências, como coleta de evidências e oitiva de testemunhas, num desdobramento que, segundo juristas, acende o pavio de um potencial conflito de competências entre as instituições policiais.
Em um contexto onde a Polícia Civil se vê relegada a um segundo plano em questões de investigação, surgem questionamentos incisivos sobre os limites éticos e legais dessa mudança paradigmática. Para membros da classe policial, a medida representa uma clara usurpação de suas funções e uma ameaça à integridade do sistema de justiça criminal.
Central para compreender a controvérsia é o próprio conceito do Termo Circunstanciado, um instrumento utilizado para o registro de ocorrências de natureza leve, que tramitam nos juizados especiais e se caracterizam por uma celeridade processual. No entanto, ao conceder à PM o poder de conduzir investigações em casos dessa natureza, abre-se uma caixa de Pandora onde a linha entre a vítima e o investigador se torna tênue e sujeita a distorções.
De acordo com a ordem preparatória, o TC será preenchido eletronicamente por policiais militares em serviço de patrulhamento, para posterior revisão por agentes graduados nas instalações dos batalhões. Esse procedimento, embora aparentemente simplificado, acarreta implicações significativas no que tange à integridade e à imparcialidade das investigações.
Além disso, a proposta prevê que os batalhões sejam equipados para "cumprir as diligências requisitadas" e "zelar pelo material apreendido", deslocando para a esfera militar responsabilidades tradicionalmente atribuídas à Polícia Civil. Este movimento, embora justificado pela necessidade de otimizar recursos e acelerar processos, suscita questionamentos sobre a capacidade da PM de desempenhar funções que transcendem sua missão primordial de manutenção da ordem pública.
A crescente tensão entre as duas instituições policiais e a incerteza quanto aos desdobramentos futuros dessa mudança estrutural alimentam um cenário de inquietação e desconfiança no seio da sociedade paulista. Enquanto o governo Tarcísio de Freitas avança com seu ambicioso plano de reconfiguração do aparato policial, resta aos cidadãos e aos observadores atentos aguardar os desfechos dessa saga polêmica, cujas repercussões reverberarão por muito tempo no panorama da segurança pública do estado.
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