Inquérito apura impactos ambientais e socioeconômicos causados por construção de linhas de transmissão
Parte da área afetada pela construção das linhas de transmissão de energia na Baixada Santista. |
O Ministério Público de São Paulo, por meio do Grupo de Atuação Especial de Defesa do Meio Ambiente na Baixada Santista (Gaema-BS), instaurou um inquérito civil para investigar o desmatamento de 35 hectares de florestas e mangues nas cidades de Santos, Guarujá e Cubatão. O objetivo é averiguar o licenciamento ambiental referente à construção de 27,21 quilômetros de linhas de transmissão pela Empresa Litorânea de Transmissão de Energia S.A. (ELTE).
A instauração do inquérito ocorreu nesta terça-feira (25), após a confirmação de que o Gaema-BS investigará as licenças ambientais emitidas para a construção das linhas de transmissão. A investigação visa apurar os impactos ambientais e sociais provocados pela obra, que tem gerado preocupações entre os moradores e pescadores locais, especialmente em relação à preservação dos manguezais e da fauna nativa.
A Associação Litorânea da Pesca Extrativista Classista do Estado (Alpesc) denunciou ao Ministério Público práticas prejudiciais que estariam causando a morte de caranguejos em larga escala e dificultando o acesso a canais do Estuário, essenciais para a subsistência dos pescadores artesanais e extrativistas. De acordo com a Alpesc, uma balsa a serviço da ELTE estaria bloqueando esses canais, prejudicando a pesca local.
A denúncia, protocolada no início do mês, solicita compensações financeiras para os caiçaras até que os manguezais sejam plenamente recuperados, permitindo a retomada segura das atividades extrativistas. "Ambientalistas natos, estamos vivenciando os impactos diariamente e nos perguntamos: será que está correta a maneira como está sendo conduzida a obra?", questionaram os pescadores no ofício enviado ao MP.
Os moradores do Monte Cabrão, bairro da Área Continental de Santos com aproximadamente 1.200 habitantes, têm suas raízes profundamente ligadas à pesca e expressaram preocupações quanto aos critérios utilizados pela Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb) para conceder a licença que autorizou o empreendimento. Eles alegam que os caranguejos não foram monitorados, coletados ou remanejados para outras áreas antes do início das atividades de supressão vegetal. A denúncia também menciona o uso de "tampas de madeira" reaproveitadas como tapetes para o trânsito de operários e máquinas sobre o mangue, causando efeitos adversos na fauna.
Um parecer técnico do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), emitido em outubro de 2023, destaca que a construção das novas linhas de transmissão representa uma ameaça significativa à sobrevivência de plantas e animais em extinção. O documento menciona oito espécies vegetais em risco, incluindo a Cattleya forbesii, uma orquídea exclusiva dos manguezais da região.
Além das espécies vegetais, o relatório do Ibama identifica que a área impactada abriga 801 espécies animais, incluindo pássaros, mamíferos e répteis. Espécies como a tartaruga-verde marinha (Chelonia mydas), o macuco (Tinamus solitarius) e o papagaio-moleiro (Amazona farinosa) estão entre os animais ameaçados. O parecer também alerta para a presença de mamíferos como o macaco-prego (Sapajus nigritus), o gato-do-mato pequeno (Leopardus guttulus) e o gato mourisco (Puma yagouaroundi), além de répteis raros como a jiboia-amarela (Corallus cropanii) e a cobrinha-da-terra (Aractus serranus).
O Ministério Público agendará, nos próximos dias, uma reunião entre representantes da ELTE e da Alpesc para discutir as preocupações levantadas pelos pescadores e buscar soluções que minimizem os impactos ambientais e sociais da obra. A iniciativa visa promover um diálogo construtivo entre as partes, buscando o equilíbrio entre o desenvolvimento econômico e a preservação ambiental.
A investigação do MP e o parecer do Ibama ressaltam a complexidade e a importância da questão ambiental na Baixada Santista. As medidas adotadas serão cruciais para garantir que os projetos de infraestrutura respeitem o meio ambiente e as comunidades locais, evitando danos irreversíveis aos ecossistemas e à cultura caiçara.
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