Jovem foi detido por cidadãos após tentativa de roubo; episódio revela a crescente impaciência da população e levanta questões sobre segurança pública
Cidadãos imobilizam suspeito de roubo à beira-mar enquanto aguardam a chegada da polícia, em mais um exemplo de ação popular diante da insegurança. |
Na ensolarada manhã de domingo, no cenário idílico da Avenida Castela Branco, no Bairro Aviação, um episódio de vigilância comunitária tomou forma. Enquanto turistas e moradores desfrutavam do ambiente praiano, um jovem tentou roubar um celular. Não foi longe. Interrompido por transeuntes, ele acabou preso – mas não pela polícia, ao menos não de imediato. Cidadãos comuns, de maneira eficiente e até cirúrgica, interceptaram o ladrão e o mantiveram sob controle até a chegada das autoridades.
Esse tipo de situação está se tornando, curiosamente, rotina em algumas regiões da Baixada Santista. Mas o que motiva o crescimento desse "espírito de justiça" que parece tomar conta das ruas? Seria o resultado de uma população cansada de sentir-se desprotegida? Ou a resposta de uma sociedade que se adapta à lentidão do sistema público de segurança?
O caso aconteceu em uma avenida movimentada de Praia Grande, onde a segurança, ironicamente, deveria estar em alta pela quantidade de pessoas frequentando o local. No entanto, a facilidade com que um ladrão tentou seu golpe mostra que, mesmo em áreas visíveis, o crime continua a espreitar. As circunstâncias do crime não são surpreendentes: um celular visível, uma vítima distraída, e a ação rápida de um criminoso com algum treinamento em furtos oportunistas. O que de fato chama atenção é a resposta quase instantânea da população, que, num gesto coletivo, prendeu o suspeito.
Testemunhas afirmam que o ladrão não teve sequer tempo de tentar uma segunda manobra. "Ele deu o bote e, em segundos, já tinha gente correndo atrás dele. Quando vi, já estava no chão, imobilizado", relatou um comerciante local. O desfecho, que evitou uma fuga, talvez tenha sido mais eficaz do que a chegada da polícia, que normalmente levaria alguns minutos para chegar. "Se a gente não faz nada, ele foge. A polícia demora, é muita burocracia", acrescentou outro morador, visivelmente satisfeito com a ação popular.
O episódio, que termina com aplausos dos transeuntes e com o suspeito entregue às autoridades, também acende um alerta. Até que ponto a população pode – ou deve – intervir diretamente em situações de crime? E mais, qual o limite entre a legítima defesa de direitos e a perigosa fronteira da justiça com as próprias mãos?
É verdade que a sensação de insegurança tem aumentado. Os noticiários e as redes sociais transbordam relatos de roubos e assaltos nas cidades litorâneas, que um dia já foram consideradas refúgios de tranquilidade. Mas a atitude de agir como "justiceiros" também abre margem para riscos. Não há garantia de que o cidadão comum tenha o preparo físico, técnico ou emocional para lidar com um criminoso, o que pode gerar tragédias, ao invés de soluções.
Num contexto em que a população se sente abandonada, a vontade de resolver os problemas por conta própria cresce. Mas o que parece ser um ato heróico pode facilmente se transformar em erro. Exemplo disso são casos em que a ação popular resulta em agressões desnecessárias ou em linchamentos, cenários em que a linha entre a proteção e o crime se torna tênue.
A pergunta que ecoa após episódios como esse é simples: por que a população está assumindo o papel da polícia? A resposta parece complexa, mas envolve a crescente insatisfação com a demora na resposta estatal e a falta de um policiamento ostensivo mais presente. Quando cidadãos sentem que o aparato de segurança pública não dá conta de suas funções, é natural que busquem alternativas. Contudo, agir por conta própria, ainda que motivado pela indignação, cria outro tipo de vulnerabilidade: o descontrole das ações populares.
O caso não é isolado. Ocorrências semelhantes vêm sendo registradas em várias regiões, especialmente em áreas de maior movimentação turística, onde a oportunidade de crimes é maior. A questão não é apenas a quantidade de assaltos, mas a percepção de abandono pela segurança pública que tem levado a população a tomar as rédeas.
Mas a resposta para esse problema, ao que parece, vai além de mais viaturas nas ruas. Trata-se de uma necessidade urgente de reestruturar o sistema de segurança de maneira eficiente e confiável, devolvendo à população a confiança de que seus direitos serão preservados sem a necessidade de riscos pessoais.
O jovem detido foi levado à delegacia para as devidas providências. Não houve relatos de violência excessiva por parte dos cidadãos que o contiveram, o que, infelizmente, nem sempre é a regra em situações assim. Ele será julgado, e, ironicamente, talvez a justiça tradicional ainda seja o caminho mais seguro, embora, na prática, tenha sido a última a agir naquele dia.
Resta à sociedade continuar observando, com a mesma atenção com que prendeu o ladrão, se as soluções virão do Estado – ou se os cidadãos continuarão a dividir o papel de guardiões da lei. Afinal, por quanto tempo a justiça pode ser feita nas calçadas antes que ela perca o controle?
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