Quando o desconto na conta d'água parece uma miragem no meio da tempestade
Sistema vulnerável: a promessa da tarifa social da Sabesp esbarra na burocracia e na incerteza. |
Se você é uma das famílias inscritas no Cadastro Único (CadÚnico), prepare-se para uma surpresa – e não daquelas agradáveis. A Sabesp, estatal responsável pelo fornecimento de água em boa parte de São Paulo, anunciou que essas famílias terão acesso a tarifas reduzidas por meio de uma nova modalidade: a "Tarifa Social" e a "Tarifa Vulnerável". Mas como tudo que envolve políticas públicas e estatais, a realidade é um pouco mais complicada do que a propaganda brilhante sugere.
Você deve estar pensando: "Ótimo! Finalmente uma chance de economizar". Só que, na prática, as águas podem não ser tão tranquilas assim.
De acordo com o novo anúncio, a Sabesp promete oferecer descontos para famílias de baixa renda que estão no CadÚnico, possibilitando que paguem valores mais baixos na conta de água. O discurso oficial é bonito: inclusão, apoio às populações mais vulneráveis e um suposto alívio financeiro. No entanto, basta olhar um pouco mais de perto para perceber que o buraco é, como sempre, mais embaixo.
Primeiro, há a questão de quem realmente se enquadra no benefício. Muitos podem acreditar que, por estarem no CadÚnico, o desconto cairá na conta como mágica, mas o critério exato de quem será contemplado continua mais nebuloso que a água barrenta que às vezes sai das torneiras. A própria Sabesp admite que nem todos os cadastrados terão direito, e aí começa a primeira dor de cabeça.
É quase irônico. Enquanto a Sabesp batiza um de seus novos programas de "Tarifa Vulnerável", a verdadeira vulnerabilidade parece estar no sistema que, previsivelmente, não será simples de acessar. Imagine-se enfrentando a famosa burocracia brasileira: longas filas (digitais ou presenciais), documentos que precisam ser atualizados em várias esferas, e uma constante sensação de que o benefício, no final das contas, não compensará o esforço.
Quem já tentou acessar qualquer tipo de tarifa social ou benefício estatal sabe que o caminho não é reto. E, por falar em "Tarifa Vulnerável", o nome é bastante apropriado – se não para as famílias, talvez para o próprio sistema que a Sabesp está implementando. A fragilidade das ferramentas digitais e a dificuldade em atualizar o CadÚnico são algumas das barreiras para que os beneficiados consigam, de fato, o desconto prometido.
Enquanto as tarifas sociais prometem aliviar o bolso de alguns, a pergunta que fica no ar é: quem arca com esse custo? A Sabesp é uma empresa, afinal de contas, e empresas existem para lucrar. É previsível que, assim como outros benefícios de cunho social, o custo será diluído entre os outros consumidores – aqueles que já estão acostumados com os recorrentes reajustes de tarifas. Não se surpreenda se, em breve, todos notarem um aumento discreto (ou nem tanto) em suas contas de água.
E mais: o anúncio da "Tarifa Social" não vem acompanhado de uma análise detalhada sobre o impacto nas finanças da estatal. Afinal, quão sustentável é oferecer descontos para milhões de famílias em um estado que enfrenta desafios constantes no abastecimento de água? Sem planejamento adequado, essa "solução" pode se transformar em mais um problema no futuro próximo.
Entre promessas de inclusão e os desafios burocráticos de sempre, o que fica claro é que o discurso sobre justiça social, quando vindo de estatais e grandes corporações, sempre merece uma análise mais cuidadosa. Para as famílias de baixa renda, qualquer alívio é bem-vindo, mas é prudente não contar com uma água tão cristalina quanto a Sabesp gostaria de fazer parecer. O desconto prometido pode ser mais uma gota no oceano de complexidades que já enfrentam.
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