Com manobras de bastidores, revogação do seguro SPVAT e restrições nos bloqueios de emendas abrem espaço para cortes seletivos
Câmara dos Deputados e a votação do pacote fiscal: pressão política e interesses regionais moldaram o acordo final. |
Em um desfecho que mistura pragmatismo político e pressão legislativa, a Câmara dos Deputados revogou, nesta quarta-feira (18), a recriação do Seguro Obrigatório para a Proteção de Vítimas de Acidente de Trânsito (SPVAT), conhecido anteriormente como DPVAT. A decisão marca o fim de uma tentativa de ressuscitar o polêmico seguro, extinto em 2020, e estabelece novos limites para o bloqueio de emendas parlamentares.
A manobra ocorreu após um acordo entre o governo e deputados, culminando na aprovação de destaques ao primeiro projeto de lei complementar do pacote de corte de gastos. Na véspera, o texto-base havia sido aprovado com folga: 318 votos a favor e 149 contrários, muito acima do mínimo necessário de 257 votos.
Originalmente previsto para entrar em vigor em janeiro, o SPVAT já enfrentava resistência de governadores e críticas generalizadas. Criado para substituir o DPVAT, o novo seguro carregava a promessa de proteger vítimas de acidentes de trânsito, mas esbarrou em questionamentos sobre sua viabilidade e custos adicionais para motoristas. Com a revogação, o governo evita confrontos com lideranças estaduais e tenta concentrar esforços na continuidade do pacote fiscal.
Outro ponto sensível foi a discussão sobre o contingenciamento de emendas parlamentares. Inicialmente, o governo pretendia congelar até R$ 7,6 bilhões em emendas no próximo ano, incluindo obrigatórias e não obrigatórias. Contudo, após negociações, ficou decidido que apenas emendas de comissões e bancadas estaduais não impositivas serão afetadas, representando um contingenciamento de até R$ 1,7 bilhão.
A mudança desidrata a capacidade do governo de gerar superávit primário, mas preserva recursos considerados essenciais pelos parlamentares. "Estávamos diante de um impasse, e esta solução protege as bases regionais dos deputados sem comprometer completamente o ajuste fiscal", afirmou o relator do projeto, deputado Átila Lira (PP-PI).
O projeto também manteve a criação de gatilhos fiscais, que proíbem a ampliação de incentivos tributários e limitam o crescimento anual das despesas com pessoal a 0,6% acima da inflação, caso haja déficit primário no ano anterior. As regras se aplicam aos Três Poderes, além do Ministério Público e da Defensoria Pública, e vigoram até que as contas públicas registrem superávit primário.
A partir de 2027, novas restrições serão implementadas caso os gastos discricionários tenham redução nominal em relação ao ano anterior. A medida busca garantir maior controle sobre as contas públicas, mas enfrenta resistência de setores que apontam possíveis impactos na prestação de serviços essenciais.
Entre 2025 e 2030, o governo poderá utilizar os superávits de cinco fundos nacionais para abater a dívida pública, que acumulavam, em 2023, saldo positivo de R$ 18 bilhões. São eles:
_Fundo de Defesa dos Direitos Difusos (FDD): R$ 2 bilhões
_Fundo Nacional de Segurança e Educação de Trânsito (Funset): R$ 1,6 bilhão
_Fundo do Exército: R$ 2,5 bilhões
_Fundo Aeronáutico: R$ 8,7 bilhões
_Fundo Naval: R$ 3 bilhões
O relator retirou da proposta os fundos destinados a investimentos estratégicos, como o Fundo Nacional Antidrogas (Funad), o Fundo da Marinha Mercante (FMM) e o Fundo Nacional de Aviação Civil (Fnac), considerados essenciais para determinadas áreas.
Com as alterações, o projeto segue agora para o Senado, onde também deve enfrentar intensos debates. Enquanto o governo tenta equilibrar as contas e atender demandas do Congresso, especialistas alertam para o risco de soluções de curto prazo que podem comprometer a sustentabilidade fiscal no longo prazo.
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